Lilienthal – “A partida que mudou minha vida”

Lilienthal, A. Capablanca, J.R.
Hastings, 1935
A partida que mudou minha vida” (Lilienthal), posição após 19. Dxe4
Vamos começar com uma pequena história verídica para ilustrar como é famosa a posição acima. Em 1992, o reaparecido Bobby Fischer reconhece um senhor de 80 anos de idade acompanhando o famoso matchrevanche contra Spassky. Fischer, então, vai ao encontro dele e, sorrindo, cumprimenta-o da seguinte forma: “peão e5 toma cavalo em f6”. Tratava-se do Grande Mestre húngaro Andor Lilienthal!

Além da beleza do sacrifício de Dama, a partida é famosa por ser uma das pouquíssimas derrotas do lendário José Raul Capablanca em torneios oficiais. Mas, como afirmou Henry Golombek quando comentou esta partida, uma derrota assim “honra até um campeão do mundo”. Em toda a sua carreira, Capablanca perdeu menos de cinquenta partidas oficiais.

Em entrevista à revista holandesa New in Chess em 1997, Lilienthal disse que, apesar de não ser sua melhor partida (já que contou com um erro de Capablanca), foi ela que mudou sua vida. Por causa desta vitória, ele foi convidado para participar do forte torneio de Moscou no mesmo ano e acabou permanecendo por lá, escapando assim do nefasto destino que os judeus húngaros teriam nos anos da II Guerra Mundial.
O encanto desta posição é o brilhante sacrifício de dama que desmonta a posição de Capablanca, forçando-o a abandonar alguns lances depois. A partir do diagrama, a continuação é 20. exf6! Dxc2 21. fxg7 Tg8 22. Cd4! com a ameaça de mate, as negras são forçadas a devolver a Dama e entrar numa posição perdida 22. … De4 23. Tae1 Cc5 24. Txe4+ Cxe4 25. Te1 Rd7 26. Txe4 e as negras abandonam.

Outra jóia de Anderssen

Anderssen, A. Dufresne, J.

Berlim, 1852
Partida Sempre Viva, posição após 18. … Tg8.
 
Após ter assegurado seu lugar na posteridade com a Partida Imortal, já bastante popular na própria época em que foi jogada, Anderssen não se deu por satisfeito e honrou o xadrez com outra obra-prima.
 
Jean Dufresne não era um jogador tão forte como Kieseritzky, mas teve o privilégio de ser pupilo do próprio Anderssen, um dos motivos de o histórico entre os dois ser tão favorável para este último (+25 –5 =2, incluindo esta partida Sempre Viva). Além de ser o perdedor da partida Sempre Viva, Dufresne voltou-se mais para o ensino e divulgação do jogo e passou para a posteridade enxadrística como o autor de um dos mais famosos livros de xadrez do século XIX Kleines Lehrbuchder Schachspiels , que segue sendo editado até os dias de hoje!
 
Após uma disputa equilibrada, no mais puro estilo romântico de ataque, Anderssen sacrifica seu cavalo, que foi erroneamente aceito, trazendo à luz um das mais belas combinações de mate da história do jogo: 19. Tad1! Dxf3 (19. … Dh3 ainda permitiria às negras se defender). 20. Txe7 Cxe7 21. Dxd7! Rxd7 22. Bf5+ (duplo) Re8 23. Bd7 Rf8 24. Bxe7++.

A mais famosa posição da história do Xadrez

Anderssen, A. xKieseritzky, L.
Londres, 21-6-1851
Partida Imortal, posição após 18. Bg1.

(FEN: rnb1k1nr/p2p1ppp/3B4/1p1N1N1P/4P1P1/3P1Q2/PqP5/R4Kb1 w kq – 0 19)

A posição acima é talvez a mais famosa da história do Xadrez. As brancas estão prestes a sacrificar sua segunda torre em troca de um ataque finalizador. Adolf Anderssen, que justamente neste ano de 1851 seria afamado como “Campeão do Mundo” (não existia a FIDE na época), ao vencer o forte torneio internacional de Londres, jogou esta partida durante um recesso daquele evento. Lionel Kieseritzky, que morava em Paris no Café de La Régence, era um dos mais fortes mestres europeus naquela época, inclusive tendo vantagem no confronto direto contra Anderssen (+7 -5 =2, excluindo-se esta Partida Imortal). Tristemente, para Kieseitsky, esta derrota parece ter selado o início de sua decadência, agravada por problemas financeiros. Passou para a história como o ‘Perdedor Imortal‘ e morreu apenas dois anos após esta partida.

O encanto desta partida é a brilhante sequência de sacrifícios de peças em troca de tempos de desenvolvimento utilizados no ataque direto a um rei não rocado, no centro do tabuleiro.

A partida continuou assim: 19. e5! Dxa1 20. Re2 … Segundo Kieseritzky, num artigo para o seu periódico La Régence, ele abandonou após este lance. Porém, outra versão informa que ele ainda teria jogado 20.  … Ca6, após o qual Andersen teria anunciado xeque-mate em 3 lances, e, só então Kieseritzky teria abandonado. Essa pequena imprecisão sobre o desfecho é típica de confrontos informais, sem registro em súmula, mas em nada reduz o brilho desta partida. Provavelmente, os lances finais com a bela combinação de mate não chegaram a ser feitos no tabuleiro pelos protagonistas, mas tem sido realizados muitas vezes desde então! Ainda serão repetidos incontáveis vezes, enquanto existirem resquícios do Xadrez, este belo jogo, na face do planeta: 21. Cxg7+ Rd8 22. Df6!! Cxf6 22. Be7#. 


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