Xadrez e Abnegação

O tema de hoje é abnegação.
“Como assim!? Não seria, combinação?”
Não, abnegação mesmo, mas aplicada ao Xadrez.
Nos muitos anos que estou envolvido com o Xadrez, desde a época dos torneios escolares, Xadrez universitário, de forma mais conceitual (nas pausas para pensar na vida profissional), no retorno em 2010 e, mesmo agora, neste novo momento conceitual, eu presenciei muitos casos de abnegação.
É abnegado o jogador que vai sublimando, derrota após derrota, seu amor pelo jogo. Abnegado o candidato a Mestre, que abre mão de carreiras mais rentáveis, pelo amor ao jogo. Abnegado o árbitro, muitas vezes abrindo mão do convívio familiar em finais de semana, para dar aos outros enxadristas o prazer de disputar uma competição.
Eu conheci muitos abnegados, mas hoje tenho algo recente a falar de alguns: todos da Academia Damasceno de Xadrez (ADX), em especial na figura do patrono Sr. Alécio Damasceno,  e do Prof. Ari Maia. Foram pessoas que muito me motivaram nos caminhos do jogo, cada um à sua maneira, numa determinada época.
O Prof. Ari Maia, já conhecido em todo o Brasil pelo seu trabalho voluntário pelo crescimento da prática do Xadrez, foi meu primeiro professor do jogo, e hoje está a frente, entre outras ações, da Liga Brasileira de Xadrez (LBX). Ele acaba de lançar e disponibilizar gratuitamente na internet um e-book com as Leis do Xadrez  Comentadas. A visão, acertada, de Ari Maia é que popularizar as regras e formatos dos torneios é um catalisador natural para o crescimento do número de praticantes do Xadrez. Gostaria de parabenizar meu antigo professor pela iniciativa.
Já a ADX, eu conheci quando fui morar em Natal (RN). Fiquei impressionado com a Academia. Tive logo a grata satisfação de lembrar que havia enfrentado (e perdido para) o Sr. Alécio no famoso Torneio Circuito do Sol, realizado em Fortaleza em 1994. Ele ainda conserva a súmula da partida. Ali, quiçá no melhor salão de jogos do Brasil, joguei muitos torneios na minha mais recente tentativa de retorno ao Xadrez de competição, e foram experiências memoráveis. Lá na ADX eu acho que se segue à risca o antigo lema do CXEB: “Leva o Xadrez, traz o amigo”.
Átila, Lênia, este autor e Alécio Damasceno (acervo pessoal)
Como estou partindo de Natal, fui recentemente me despedir e deixar uma pequena lembrança em sinal de amizade e gratidão àquela família que adotou o Xadrez como missão e estilo de vida.
Mesmo agora, numa posição mais afastada, continuo observando e saudando esses abnegados heróis do jogo. Pessoas assim não movem somente peças frias nos tabuleiros, elas movem o Xadrez pelo Mundo.Compartilhe: http://bit.ly/XadrezAbnegado

Fui natalense: 10 anos em ritmo de Xadrez

Visão geral da cidade de Natal – RN (fonte)
Muitas vezes, numa partida, posicionamos nossas peças na melhor casa, fica uma maravilha! A gente para de se preocupar com ela, pois ali exerce seu máximo poder de ação, domina espaço importante para o ataque, inibe o avanço de forças inimigas.

Porém, para arrematar a partida, ou para defender um contra-ataque repentino, é comum ser necessário remover a peça da casa ideal, e a teima ressentida pode causar até mesmo a derrota.

Ao avançar no Xadrez da vida, precisei deixar a cidade onde nasci, qual peão que avança da casa inicial para jamais retornar. Quis a dinâmica dos acontecimentos que fosse parar na cidade de Natal no ano de 2006, e lá permaneci pelos últimos dez anos.

Com o tempo, fui criando identidade com a nova cidade e lá completei importantes lances do meu desenvolvimento pessoal: primeiro emprego, primeira casa, casamento e filhos. Em especial, retomei a prática enxadrística séria, que havia interrompido havia pelo menos outros dez anos.

Se o jogo de Xadrez tem sido tantas vezes utilizado como metáfora da vida, não me parece estranho descrever esses meus anos como lances de uma grande partida contra o acaso (ou ajudado por ele).

O Xadrez tem três fases, Abertura, Meio-jogo e Final. Quantas terá a vida?

Nos primeiros anos, vivemos a fase da Abertura, com um desenlace ligeiro, seguindo movimentos mais ou menos conhecidos e comuns: engatinhar, andar, frequentar a escola, se formar. Frequentemente, não faz mal se perdemos um ou dois anos em experimentos menos convencionais, algo como um gambito de dias.

Então, já adultos, nos sentimos prontos, com vigor, cheios de habilidades afiadas. Se admitirmos que este rol de qualidades pode se comparar com a presença da Dama no tabuleiro, sem dúvida estamos falando do Meio-jogo. Aqui, os planos estratégicos amiúde miram longe uma vida tranquila e abastada no final, mas é preciso estar atento para não esquecer nenhum detalhe tático: uma oportunidade, uma conta a se pagar, uma data de aniversário!

As peças vão sumindo, trocamos entusiasmo e habilidades, por outras vantagens como sabedoria, experiência. Fortalecemos nossa personalidade com o passar dos anos e fatalmente chegaremos à fase Final, da partida, dos dias, do tempo. O que nos trarão os frutos de nossas escolhas, nossas jogadas? Muitas vezes, basta um peãozinho de vantagem que chega livre à borda adversária.

Foram dez anos em Natal, uma cidade onde entendi muito mais sobre o meu Xadrez e sobre as nuances da existência. Acabo de me retirar duma posição que pensava ser ideal; a tática se impôs, foi preciso jogar conforme. Ainda é pleno meio-jogo, o final é ainda distante, mas algumas peças já se foram, a cadeia de peões, as linhas gerais de ação e possibilidades mais óbvias já estão traçadas.

Este autor pondera sua próxima jogada.
Campeonato Estadual, Natal-RN, 2010 – 1ª rodada.
É hora de seguir o conselho de Neruda e sentar com paciência, não para buscar a luz caída no poço, mas para rever os planos, avaliar a Posição com carinho, escolher o próximo movimento.

Vejo daqui variantes diversas e já não preciso enxergar tantas jogadas à frente. Uma nova casa ideal está somente a uma ideia de distância.

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