Novo livro brasileiro de xadrez

O Mestre Internacional de xadrez Marcos Paolozzi (de quem já falei no site amigo Reino de Caíssa) nos brinda com um excelente livro, muito bem escrito, editado com capricho, no qual nos mostra detalhes sobre a vida e o xadrez de quatro dos maiores jogadores do Brasil em todos os tempos, os grandes mestres Jaime Sunyé, Gilberto Milos, Giovanni Vescovi e Rafael Leitão. O prefácio é do grande mestre Felipe el Debs.

O livro tem partidas tanto desses mestres brasileiros como de outras lendas do xadrez mundial, tais quais Fischer, Spassky, Korchnoi e Karpov, para contar somente alguns. As partidas são cuidadosamente comentadas pelos próprios mestres. Todas bem diagramadas e em notação algébrica. Uma nova e valorosa contribuição para a literatura brasileira de xadrez!

Livro MI Marcos Paolozzi
Exemplo da cuidadosa diagramação do livro

O livro está no formato e-book para Kindle e está gratuito até o dia 04/07/2021! Não perca a chance!

Abaixo uma rápida apresentação do MI Marcos Paolozzi escrita por ele mesmo no livro:

Marcos Paolozzi apaixonou-se pelo xadrez aos onze anos, e tornou-se Campeão Brasileiro e Mestre Internacional. Atualmente desenvolve atividades de consultoria de valores mobiliários e “coaching” de equipes e indivíduos.

MI Marcos Paolozzi
MI Marcos Paolozzi

O MI Marcos Paolozzi foi campeão brasileiro de xadrez em 1983 (junto com Sunyé) e já esteve entre os 400 melhores enxadristas do planeta! Ele mantém um perfil profissional no Linkedin e está à frente do site ChessAcademy.

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Live com Holodeck Editora

Será que a tríade Literatura – Xadrez – Inteligência Artificial tem mesmo algum sentido? Conversa com Katiusha de Moraes da Halodeck Editora.

No último 15 de janeiro, tive a honra de inaugurar uma vibrante série de “lives” promovidas por Katiusha de Moraes em seu novo projeto, a Holodeck Editora, que vem substituir a Editora Expresso Poema pela qual publicamos o livro infantil ‘Que Peça eu Quero Ser?‘. Falamos da fértil tríade Literatura – Xadrez – Inteligência Artificial (IA).

Alguns dos temas que discutimos, por exemplo, foi a ligação de diferentes escritores com o xadrez, em especial o nosso Machado de Assis, que foi um entusiasta do jogo e que publicou um problema de sua autoria em 1877. O mais interessante, e que descobri depois da “live”, é que o problema de Machado foi o primeiro publicado por um brasileiro no país!

As brancas dão xeque-mate em duas jogadas
Machado de Assis/Ilustração Brasileira – 1) HISTÓRIA VIVA: Enigmas no tabuleiro 2) Herculano Gomes Mathias, “Machado de Assis e o jogo de xadrez” (Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, vol. 13, 1952-1964.) (Solução no final da postagem)

Machado de Assis também tomou parte no primeiro torneio de xadrez realizado no país, em 1880. Foi contemporâneo e adversário daquele que é considerado o primeiro mestre brasileiro do jogo, Dr. Caldas Vianna.

A conversa não parou por aí, e tentamos esboçar as relações do xadrez e da literatura com a IA. Não tive como destacar melhor o fantástico conto ‘O Mestre de Moxon’, publicado em 1899 pelo escritor norte-americano Ambrose Bierce. Além de correlacionar o xadrez com a ideia de um autômato inteligente capaz de jogar, Bierce foi um dos pioneiros a descrever o que seria um “robô” antes mesmo dessa palavra ser criada.

A leitura do conto (que se encontra em domínio público e é gratuito em língua inglesa) é fortemente recomendada.

Bierce - Mestre Moxon - PT BR - xadrez literatura IA
Capa de uma versão em português de ‘O Mestre de Moxon’ de Ambrose Bierce

Bierce certamente foi influenciado pelo Turco, um jogador mecânico de xadrez que assombrou muita gente na Europa e América do Norte nos séculos XVIII e XIX. Dentre os ilustres adversários do Turco estão Napoleão Bonaparte e Benjamin Franklin, por exemplo.

Edgar Alan Poe chegou a escrever um ensaio, tratando de desvendar o que ele pensava (com razão) ser uma farsa.

O Turco foi destruído por um incêndio em 1854 (apenas o tabuleiro se salvou e foi usado em uma reconstrução fiel do autômato mais de 100 anos depois).

Apesar de ser uma máquina surpreendente, capaz por exemplo de demonstrar a solução do famoso ‘Caminho do Cavalo‘, a “inteligência” da máquina era devida a um operador humano que se escondia por entre as engrenagens e era efetivamente quem jogava (diferentes pessoas fizeram esse papel ao longo dos anos). O romance ‘A máquina de xadrez‘, de Robert Lohr, traz muitos detalhes sobre o Turco, peça central em sua trama ficcional.

Uma cópia do Turco foi reconstruída em 1984

Falamos ainda de AlphaGo, AlphaZero, Deep Blue, a paixão de Marcel Duchamp pelo xadrez, xadrez feminino e, é claro, da série ‘Gambito da Rainha‘.

A íntegra da “live” está no instagram da Holodeck:

Live do dia 15/01/2021 com Katiusha de Moraes

Agradeço a oportunidade e deixo as portas abertas a outros convites pra falarmos de assuntos que são tão empolgantes para mim! A Holodeck já nasce ligada a esses temas, e acredito que grandes obras e grandes iniciativas serão levadas adiante pela editora.

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Deixem as Fake News longe do xadrez

Vivemos a era da disseminação de mentiras com cara de verdade. Mas, por favor, deixem o xadrez fora disso!

Emmanuel Lasker tem uma famosa frase sobre verdade e xadrez: “No tabuleiro de xadrez, a mentira e a hipocrisia não sobrevivem por muito tempo”.

Xadrez, de fato, é terreno para a busca da verdade, e muito de seu encanto vem do fato que, embora perante os olhos de qualquer um, ela fique tão escondida entre as peças e suas intrigas de cores alternadas.

Por esses dias, recebi de diversas fontes (inclusive de alguns enxadristas) uma triste mentira:

Fake News não têm poupado nem o xadrez

A imagem, muito famosa, mostra uma exibição de simultâneas realizada em 1920 pelo garoto prodígio Samuel Reshevsky (1911 – 1992). Na ocasião, Reshevsky enfrentou não somente 8, mas 20 adversários (nem todos na imagem) e, ao contrário da mentira divulgada, derrotou todos.

Fico imaginando as razões de quem criou a falsa informação e iniciou a corrente de falsidade, mas o fato que entendo ainda menos é o porquê de muitas pessoas passarem adiante… Algumas como uma interrogação (“isso é verdade?”), outros como quem manda uma piada (sem graça alguma).

Algumas simples verificações antes de propagar a imagem teriam detido sua proliferação (falta de cuidado que, aliás, tem sido comum e decisiva para o sucesso do espalhamento de mentiras em outros contextos da vida):

  1. Uma foto de um garoto que perde para mestres adultos no início so século XX seria algo tão incrível assim para merecer a posteridade?
  2. As feições desamparadas de alguns dos adversários na foto não servem de pista de que eles estão desconfortáveis (ou seja, perdendo)?
  3. As peças do tabuleiro não estão bem visíveis, mas há diversas fontes, como a Wikipédia, que falam exatamente do contexto da foto e do desfecho das partidas.
Nota na Wikipédia sobre o tema.

A foto original foi feita durante uma seção de partidas simultâneas do jovem prodígio contra um grupo de 20 fortes jogadores parisienses. A disputa ocorreu no Club des Echecs du Palais Royal no dia 16 de mai de 1920 (o pequeno Samuel, portanto, ainda não havia completado 9 anos de idade).

Relatos efusivos da imprensa francesa da época reportam que ele venceu todos os 20 adversários, mas apenas um das partidas, contra Herzfeld, foi preservada.

Para fazer justiça a Samuel Reshevsky, fica o registro de que era dotado de extraordinário talento para o xadrez, desde muito cedo descoberto.

Seus pais (extremamente pobres) foram convencidos por um “empresário” para que ele se apresentasse (a dinheiro) perante adversários mais velhos em exibições por várias partes do mundo, a começar pela Europa. E houve muitas, além de Paris, citada acima, até que a família seguiu para os EUA, onde acabou se instalando definitivamente.

Reshevsky (lado esquerdo em pé), em 1921, prestes a enfrentar 20 jogadores em Cleveland (EUA).

Autoridades norte-americanas tiraram o jovem Reshevsky da tutela de seus pais, pois foi considerada abusiva a forma de explorar os talentos do menino, que sequer frequentava a escola.

Sua tutela foi dada a um milionário filantropo que cuidou da educação do jovem até sua graduação na Universidade de Chicago em 1934.

Após a graduação, Reshevsky voltou a tomar parte em competições de alto nível, por exemplo, vencendo o Torneio de Margate em 1935 à frente de Capablanca (a quem venceu no confronto individual).

Apesar de nunca ter sido um profissional do xadrez em tempo integral, Reshevsky foi um sério candidato ao título mundial até o final dos anos 1960, considerado por muitos o melhor jogador do mundo fora da URSS até a chegada de Fischer.

No xadrez, e muito mais na vida, a verdade é muito preciosa. Pena que uma óbvia mentira, como a citada, possa demorar tanto para ser desmentida e seu estrago possa ser irrecuperável.

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